Pioneiros da Datação Geoquímica

Artigo transcrito por Rubem Queiroz Cobra da
Rev. Esc. de Minas 55 (3)
Set. 2002

A geoquímica analítica em Minas Gerais: de Gorceix ao Geolab – A contribuição do ITI

avaliação da jazida de apatita de Araxá. Em tempo bastante curto, entre 1946 e 1948, foi entregue ao Estado um imenso depósito de fosfato, pronto para ser explotado.

Em setembro de 1945, um rude golpe se abateu sobre a equipe de químicos do ITI com o falecimento de seu expoente máximo que era o professor Caio Pandiá Guimarães, com apenas 31 anos de idade. Deixou uma obra importante, sendo cada uma de suas publicações (14 ao todo) um marco em nossa geoquímica. À medida que se diversificavam as pesquisas no ITI, novos técnicos eram contratados e novos métodos analíticos eram introduzidos: os químicos Milton Vieira Campos, que assumiu o laboratório de físico-química, Moacir Carneiro, que assumiu as análises de fosfatos, Cláudio Vieira Dutra que assumiu o laboratório de geoquímica e espectrografia e Marcelo F. Cavalcante, que estreiou na análise de rocha por via úmida.

Willer Florêncio, continuando seus trabalhos sobre minerais radioativos iniciados no SPM, volta a tratar da análise completa da uraninita, com amostras agora provenientes de outras regiões do Brasil, descrevendo a metodologia usada para determinação do rádio (Florêncio, 1948a), publicando, também, a “marcha analítica dos minerais do grupo da betafita”, com adaptações feitas no “processo Schoeller” (Florêncio, 1948b). O seu trabalho intensivo com as análises de minerais de pegmatito lhe trouxe a oportunidade de descrever um novo tantalato, a alvarolita (Florêncio, 1952a) e a ribeirita, uma nova variedade de zircão (Florêncio, 1952b).

Uma prática que o Instituto sempre usou foi a publicação dos métodos analíticos estudados e adotados nos trabalhos de pesquisa geológica. As espécies minerais puras quase sempre não apresentavam grandes dificuldades, pois os manuais de análise já traziam suas marchas analíticas mais indicadas. Acontece, entretanto, que os minérios podiam apresentar as mais inusitadas associações, começando as dificuldades já na dissolução inicial da amostra. Nas mais variadas associações de minerais que o laboratório enfrentou, acabou sempre resultando a publicação respectiva. Foi o caso do fosfato derivado da rocha carbonatítica de Araxá, que gerou uma metodologia muito diferente daquela de um fosfato sedimentar tipo fosforita, que vem descrita em qualquer manual de análise. O alto teor de bário, sob a forma de baritina e gorceixita, e a elevada percentagem de titânio e ferro tiveram que ser contornados (Maurício Guimarães e Marcelino de Oliveira, 1954). Na mesma publicação, aparecem os esquemas analíticos para a monazita, para a cromita e minérios de lítio. Alguns anos após a realização dos trabalhos de Caio Pandiá sobre as ocorrências de minerais de vanádio e zinco na região de Januária, MG, Marcelino de Oliveira (1954) publica seu método, usado na dosagem do vanádio pelo tanino na vanadinita e na descloisita. No caso da análise de águas minerais, Milton Campos (1954) estudou e fixou as condições para a determinação de traços de fosfato pela clorimetria.

O pirocloro de Araxá

Durante a campanha de pesquisas de minerais usados em energia atômica, patrocinada pelo Conselho Nacional de Pesquisas, o Dr. Djalma Guimarães selecionou, em 1952, algumas áreas reconhecidamente radioativas para averiguar a presença de urânio e tório e, para tal, lançou mão da prospecção geoquímica. Feitas as amostragens, que eram orientadas pela aerocintilometria e por contadores geigers no campo (principalmente em Araxá, Poços de Caldas e São João Del Rei), eram as amostras entregues ao laboratório para um grupo de químicos que as submetiam a uma análise de varredura. As amostras de Araxá eram especialmente investigadas, pois vários autores já haviam constatado a presença de fontes de água mineral fortemente radioativas na região (Andrade Júnior, 1936 e Florêncio, 1948c). Foi a primeira campanha de prospecção geoquímica com determinações multielementares entre nós, onde a espectrografia óptica de emissão foi empregada intensivamente. Eram milhares de amostras circulando no laboratório e a maioria delas revelavam anomalias muito fortes de bário, estrôncio, nióbio, terras raras, tório, fósforo e titânio. O urânio, que se mostrava sempre em baixas concentrações, era procurado pelo uso da fluorimetria, nova técnica de alta sensibilidade com o instrumental construído no próprio ITI (Dutra, 1958). Uma notícia detalhada sobre esses trabalhos, com as circunstâncias em que foi detectado o nióbio pela primeira vez no Barreiro, Araxá, foi publicada por Dutra (1985) com comentários adicionais sobre a atuação de Guimarães em relação à geoquímica analítica. Aos poucos, o urânio foi sendo relegado para o segundo plano e o nióbio, que era uma constante em todas as amostras, tornou- se o principal objetivo da pesquisa. Fazer determinação geoquímica de nióbio em regime de rotina naquela época, usando a via úmida convencional, era tarefa praticamente impossível. Entretanto o ITI já estava equipado com um novo espectrógrafo Baird, de retículo, com três metros de distância focal, acompanhado com microfotometria fotográfica, o que possibilitou estabelecer, em poucas semanas, um método rápido para determinar esse elemento em regime de rotina (Dutra e Dutra, 1956). Um método para determinação espectroquímica de tório em monazita, que havia sido desenvolvido em cooperação com o U. S. Geological Survey (Dutra e Murata, 1954), foi também adaptado para determinação desse elemento em concentrados de pirocloro de Araxá. O processo usava, como diluente, um tampão espectrográfico denominado “base de pegmatito”, pela propriedade que tem de reduzir amostras e padrões a um mesmo tipo de matriz, além de permitir o uso do zircônio como padrão interno. Essa nova metodologia do padrão interno foi discutida, em 1954, na Pittsburgh Conference on Analytical Chemistry and Apllied Spectroscopy, e acabou se tornando “figura de livro” (Ahrens e Taylor, 1961). Os trabalhos de laboratório relativos ao pirocloro de Araxá terminaram em 1957, conjugando análises instrumentais e análise por via úmida e cujos resultados constam do relatório final de pesquisa de D. Guimarães (1957), um dos trabalhos de pesquisa mineral dos mais bem sucedidos no país. Foram localizadas, naquela época, 4.643.000 toneladas de óxido de nióbio.