A Timidez

Hoje: 29-03-2024

Página escrita por Rubem Queiroz Cobra
Site original: www.cobra.pages.nom.br

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Segundo as queixas de pessoas que se consideram tímidas – e pelos diagnósticos publicados por psicólogos na rede web –, a timidez é uma condição psicológica caracterizada pela incapacidade do indivíduo de manter boa comunicação com as pessoas em algum aspecto do seu relacionamento social. A timidez obviamente representa uma certa deficiência de maturidade pessoal que, em minha opinião, pode ser corrigida.

Os jovens hoje estão conectados por meio de computadores e celulares a sites de relacionamento, a portais de entretenimento, de música, de autoajuda disponíveis na Internet. A maioria das pessoas se movimenta mais no mundo virtual da web que no mundo real. Surpreendentemente, porém, parece que nada mudou para os tímidos, senão que dispõem de mais oportunidades para mostrarem sua timidez.

Penso que estou certo ao considerar a timidez como consequência do tímido não saber fazer aquilo que pretende realizar. Por exemplo: tem medo de entrar em um restaurante porque ainda não sabe se comportar em um restaurante; tem medo de pessoas porque ainda não sabe fazer a troca de informações própria de uma conversa agradável; tem medo de dançar em um salão porque não sabe dançar; tem medo de falar em público porque não conhece a técnica para isto. Tem medo de ser observado pelas pessoas porque não sabe se vestir de um modo casual que lhe acrescente simpatia. Tudo isto são coisas que mesmo os indivíduos mais desinibidos precisam aprender.

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É conhecimento comum que a timidez não é a mesma em todos os tímidos. Ela tem objetos variados, assim como também varia a personalidade do tímido. É bastante claro – embora isto não tenha ainda sido discutido em nenhum foro –, que os tímidos caem em pelo menos três categorias bastante distintas.

Existe o tipo ressentido de tímido, que padece grande sofrimento por se sentir vítima de rejeição social ao perceber que é excluído dos círculos de amigos, geralmente na Escola. Em outra categoria está o tímido discreto, cuja timidez é mascarada por uma participação social aparentemente normal. Este não se sente rejeitado mas sim incapaz de interagir satisfatoriamente com o seu meio, e estabelece, ele próprio, barreiras para sua interação social. Há ainda o tímido cuja timidez tem um traço de paranoia, porque sente como se fosse perseguido, hostilizado ou traído pelas pessoas em seu ambiente familiar ou de trabalho.

Creio que a confusão que o assunto provoca na mente da pessoa tímida que busca um conselho vem do fato de ela ser aconselhada como se a timidez fosse sempre o mesmo fenômeno e uma só a personalidade do tímido.

Há também que separar a timidez da introversão, porque o introvertido evita se expor não por temor, mas porque um chamado interior para a reflexão torna prazeroso para ele o isolamento. Seu oposto, o extrovertido, não sente esse apelo e ama socializar-se.

O que procuro fazer nesta e na página seguinte – acessível através do link do número da página – é descrever brevemente três tipos de timidez, e os tipos correspondentes da personalidade tímida.

A timidez ressentida.

Na timidez ressentida o tímido padece de ansiedade relativa à sua aceitação social, e sofre por se sentir rejeitado, além de amargar o sentimento de ser, ele próprio, o culpado por essa rejeição. Reclama Queixa-se de que não tem coragem de se aproximar e transacionar com pessoas devido a um forte sentimento de inferioridade, reclama de que sua participação nunca é aceita, e acredita que lhe faltam dotes pessoais e habilidades sociais que não sabe desenvolver.

Na escola, amedronta-o o primeiro dia de aula, tem vergonha de se apresentar e de fazer perguntas, Nas aulas, se sente em meio a pessoas hostis, e por causa desse sentimento, não consegue fazer amizades. Detesta educação física e aterroriza-o ter que ler na frente da turma. Acaba contando com a colaboração da professora, que percebe seu embaraço e o deixa um pouco de lado. Quando ja melhor ambientado, quer e tenta se aproximar de uma grupo não consegue, porque os colegas já o têm como sujeito acanhado e incomunicável, e agem como se ele não existisse. Também não consegue se defender se é importunado, e o único lugar onde se sente mais seguro é em casa.

Formas de compensação.

Em todas as deficiências, o deficiente busca uma compensação, e a timidez não faz exceção. A frustração leva o tímido à busca inconsciente de alguma forma de poder. Irrita-se com os irmãos e principalmente com os pais, estes considerados os culpados pela situação inferior em que acredita estar. Tem vergonha dos pais, e compensa sua frustração com ofensas e desobediências, cuja consequência é o mal estar geral na família.

Uma timidez que não é compensada de alguma forma, quando o tímido atribui exclusivamente a ele próprio as causas da sua timidez, chega a um extremo de depressão não compensada que se sabe que, em muitos casos, leva ao suicídio.

Acabar com a timidez ressentida

Como a timidez ressentida é sempre evidente, não faltam conselhos ao tímido tais como “É chegada a hora de você tomar as rédeas de sua vida”, “Tenha mais confiança em si mesmo”, “Não tenha medo do que as outras pessoas vão pensar ou falar a seu respeito”. Tais conselhos produzem uma certa esperança no tímido, e podem levá-lo a erros e exageros, e piorar seu estado.

Alguns se queixam, nos debates sobre timidez na Internet, que se submeteram ao velho método de análise mais medicamentos por vários anos, com diversos médicos e psicólogos, e não melhoraram nada. Acabaram voltando ao mesmo estado de timidez e ainda mais amargurados. Não é preciso ir a fundo nas lembranças do passado, pois existe no presente medidas que podem ser postas em prática, porque – me parece – a timidez vem do simples fato da pessoa não ter a informação correta de como se procede em certas circunstâncias. Se o tímido não buscar informações a respeito, jamais deixará de se sentir.embaraçado e até mesmo incapaz de vencer sua timidez.

Por outro lado, o tímido ressentido erra sob um aspecto. Espera que o aceitem, que o ouçam, que lhe deem mostras de consideração como se isto fosse obrigação das outras pessoas. O grupo que o exclui não pode ser censurado por rejeitá-lo. Tem o direito de recusá-lo. Na verdade, ninguém é obrigado a considerar o outro, a amar o outro, a gostar do outro, nem a aceitá-lo, além do dever de lhe prestar as formas usuais de reconhecimento e cordialidade.

Poder de troca. Porém há uma coisa importante com respeito à natureza humana que o tímido precisa ter em mente. O filósofo Adam Smith baseia toda sua doutrina econômica na forte inclinação que o ser humano tem para a troca de valores. Mesmo nas coisas mais simples esta tendência se manifesta. Um sorriso discreto, oportuno e simpático leva o outro a retribuir com um sorriso, quase como um ato reflexo.

A conversação: é também uma forma de permuta. É uma barganha de opiniões, de informações, de mostras de apreço, é a arte de desafiar amigavelmente e com inteligência o outro, e escutar sua resposta atentamente. É a natureza do seu desafio que fará que lhe dê atenção. Aqui novamente, estar bem informado. Uma pergunta tal como “Então, o que acha da nossa presidente?” só despertará interesse se a pessoa está falando com um ferrenho opositor ao governo. Caso contrário, cairá no vazio e, desinteressado, seu interlocutor se afastará. Se fizer uma pergunta simples e ingênua, ou simplesmente sem nexo, todos vão rir. Não se elogia uma pessoa antes que apareça, no que ela diz, menção a alguma coisa elogiável. A página Conversação contém matéria suficiente como introdução ao assunto.

Há mais coisas com respeito à aparência, porque as queixas dos que se sentem tímidos vão além da dificuldade de criar amizade. Incluem também o embaraço que sentem quando são observadas, em situações que ser observada é inevitável, como ao passar diante de uma assembleia no átrio de uma igreja, entrar em um restaurante, ao passear na praia, etc. Combater a timidez nestas circunstâncias requer aprender a seguir certas convenções. A primeira delas é vestir-se bem.

A aparência. Isto também é uma forma de troca, porque somos objetos estéticos uns para os outro (por isso nos olhamos), de onde o dever de ter uma boa aparência. Mas esse problema precisa ser resolvido por etapas. A primeira consistirá em vestir-se com roupas limpas convencionais, ter os cabelos penteados, a barba feita, calçar sapatos atados e engraxados. Muitos modelos da alta costura são imitações vendidas a custo baixo, de modo que, mesmo sem usar roupa de grife, uma pessoa pode estar vestida dentro do estilo da estação. A página Vestir-se bem contém alguma orientação que talvez possa servir aos interessados como introdução ao assunto.

Locais públicos. Quanto ao restaurante, deve começar por certificar-se de que o estabelecimento serve aquilo que ela procura. Entra-se de um modo se o cliente vem só, e de outro se está acompanhado. V.p.f. a página Ao Restaurante, do meu portal Boas Maneiras e Etiqueta: prazer em conhecer e praticar.

Se o tímido entra em um restaurante de modo correto, pede sua comida com conhecimento, e comporta-se como manda a etiqueta, verá que sua timidez desaparecerá.

Quanto ao serviço religioso, como regra o fiel não deve entrar atrasado, ou vestir-se inadequadamente. Deve ter cuidado, para caminhar sem fazer ruído com os saltos dos sapatos, e sentar-se corretamente, porem sem altivez. Chegando no horário ou mais cedo poderá ocupar um dos lugares da frente, sem estar todo o tempo a olhar à sua volta ou até mesmo para trás, procurando os olhares dos outros, como é comum acontecer. V.p.f. a página Religião: Boas-maneiras e Etiqueta.

Verdadeira e a falsa cura

Vejo alguns perigos no processo de aprendizado contra a timidez, que são principalmente o risco de exagero, quando o tímido começa a sentir que vestir-se bem, por em prática boas maneiras e conhecimentos de etiqueta, e caminhar corretamente, o promovem aos olhos das pessoas, e passa abusar desses recursos de boa apresentação. Pode chegar mesmo a alguma forma de vício como expor despudoradamente o corpo, passar a importunar as pessoas com risadas, e outras formas de vulgaridade que incomodam.

Não pode adotar, como reação à timidez, uma euforia baseada apenas em que afinal ele pode lidar com o problema e que poderá dispensar um aprendizado e valer-se apenas do seu bom senso e vontade de agradar. Isto poderá provocar nos outros uma reação oposta a que espera, e sua fase eufórica ser sucedida por uma fase depressiva que poderá ser muito grave. A super euforia leva a comportamentos desajustados, fora do contexto, e está longe de trazer uma solução tranquila e completa. Ousar muito, tentar abraçar o mundo com as pernas, acaba levando a mais ansiedade e à síndrome do pânico (medo, tonturas, secura na boca, tremedeiras, doenças imaginárias, etc.).

Depois de adquirir conhecimento nessas particularidades, bastará ao tímido a consciência de que está se comportando de modo corretíssimo, para que encontre no olhar dos outros sinais de admiração, e até mesmo a atenção daquelas pessoas que desejam aprender e vêm em seus modos lições de como proceder.

Formação Comportamental

O tímido pode sair do seu mundo encantado da timidez, do acanhamento, da sua humildade doentia, e do limite que se impõe, e tornar-se apto a ocupar um lugar, por modesto que seja, na sociedade em que vive. Ensinar uma criança ou um jovem a alcançar essa aptidão deve ser o principal objetivo da Formação Comportamental ensinando-lhes tudo o que precisam para se sentirem à vontade em seu universo de relacionamento.

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Rubem Queiroz Cobra

Página lançada em 26-01-2012.

Direitos reservados.
Para citar este texto: Cobra, Rubem Q. – A Timidez. Site www.cobra.pages.nom.br, Internet, Brasília, 2012.